Um livro que li, que agora me falha o nome, me revelou um fato curioso. Segundo o autor, o lado esquerdo do cérebro é o que comanda os membros do lado direito, os cálculos matemáticos e as rotinas brutas: tomadas de decisões racionais e a fala e a escrita. Por sua vez, o lado direito, também comandante dos membros do lado oposto, é o lado que abstrai problemas e imagens, o que cria sentimentos e a intuição.
Na linguagem -- em qualquer língua --, "direito", "destro" é o hábil, o certo, o forte, e "canhoto", "esquerdo" é o maneta, o errado, o fraco. Pura culpa da própria linguagem, criada e exteriorizada pelo lado esquerdo, em sua exaltação de suas funções predominantes e seu domínio sobre a comunicação com o mundo, excluindo o lado "errado" de qualquer manifestação mais brilhante que as suas.
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Os absurdos da vida podem se resumir em um único: a ignorância. Ignorar uma pessoa, um sentimento, um fato; ah, ignorar um fato é, de longe, a pior das ignorâncias, tão ruim quanto a falta de tato e de amor dos dias de hoje. Falta de tato essa que não nos deixa perceber o óbvio, que nos cega e nos condena a, cada vez mais, um mundo mais individualista, egoísta, egocêntrico.
Nas Olimpíadas saímos com 3 medalhas de ouro, 15 no total. "Nossas" três medalhas foram o exemplo da nossa capacidade e determinação. Medalhas essas que também foram exemplo da falta de raça, do entreguismo e da canalhice do brasileiro, que condena seu próprio esporte por "falta de recursos". Coitados dos quenianos; se tivessem a metade de nossa falta de recursos não terminariam os Jogos em décimo-quintos, oito posições à nossa frente.
Nas Paraolimpíadas, evento muito menos relevado, anunciado e comentado, nossos atletas (me envergonha dizer "nós", não por eles mas pela nossa falta de tato) "canhotos" já têm cinco medalhas de ouro, quase o dobro em metade do tempo. Além disso, nem é preciso fazer cálculos muito complexos para chegar à conclusão de que um esportista que tem muito menos evidência na mídia tem muito menos patrocinadores interessados em sua causa, o que quer dizer que o esportista "comum" muitas, muitas vezes reclama de barriga cheia.
O fato ignorado, portanto, é o de que não basta ser "certo". A garra e a esperança em algo melhor, em algo contrário ao que somos conduzidos a acreditar, é o combustível destes homens e mulheres que dão exemplos muito mais valiosos do que qualquer palavra possa descrever.
E nem adianta culpar o lado esquerdo de nossos cérebros por tanta falta de fraternidade. Afinal, ele é responsável pelo bom senso também.